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Porto Velho, Rondônia, Brazil
Si.

O Papel




Branco pálido de náusea e ruído
                             Branco de paz de limbo de cegueira
Papel branco de fogo brando rótulo de remédio e bandeira
Papel que me amassa
          Que me dobra e me faz de formas de pássaros diversos
Piranhas esculpidas cola de criança sêmen estéril olho arrancado
                                         De livro que não ajuda
                                         Guia de viagem cheque contracheque recibo do ano passado
Carta velha
   De amor: se perdeu.


Conta de luz azul branco relógio atrasado
                                          Holerite: e o sorriso de tantos surge por tão pouco.
                                              Vai me arrastando de rua em rua de sala em sala
Autentica carimba
Cospe rasga
Amassa fornica tinta mata-borrão mata mais uma tarde quente na fila no filo cordata

E nas paredes o papel e não mão
O dinheiro de papel roupas de papel
Literatura de cordel
Livro de direito (todo errado)
Contos de bordel.
                            Limpa a boca enxuga rosto suado de rotina
                            Toalha de papel
Guardanapo declaração em cera e papel machê posto embaixo do travesseiro
Carta de demissão: e as lágrimas surgem por tão pouco.


Deita sobre faz arte escreve protesto paixão
Limpa sangue de corte bunda de merda alma de preocupação
Com valor e números impressos
Riscos imersos
Em pau-brasil
papiro
sonhos de vagas e assinaturas


Assim leva o pombo sem razão e má-vontade
Joga no lixeiro
Recicla
Ganha novo espírito
Batistério
Identidade que diz quem é (eu não consigo)
Óbito que diz quem se libertou dos dias.

                                      Entrada ingresso avião caído na sala de aula
Jornal notícia levada pro campo pra cidade dentes trincando sem frio
                                                   

                              Viva la revolutìon; mil empregos amassados como papel; menina violentada como papel; apartamento vago, carro a venda; inflação
Violentada como papel
                    Violeta feita de papel
Menina violentada como papel
                                                                   lentamente
                                                                   violentamente.
                                                                   violetamente

   Origami 
                                      Kirigami
   Antrogami
                            Dobra homem.

Que dessas vertigens só me sobra o pacato direito de sofrer, homem do sertão ou do palácio frívolo feito de carne e mentira; essas tantas manhãs e noites sem razão pra dormir além do próprio sono: e o caos surge por tão pouco.

Papel estilhaço vidro moído na garganta
Papel e medo

Onde escrevem o nascimento da glória a mentira do milênio e as cinzas da história caindo na varanda de novembro.

Extra: o salário a multidão o automóvel o rasgão o ópio a solidão.

Papel que voa e que navega que dobra e que se entrega
                                                
Papel sátira papel piada papel palavrão
Papel ciência papel sangue papel arte
Papel repúdio papel sonho papel violência

Que nele eu li o mundo

Desenhei devaneios

Fiz beijinhos de alfazema

E onde antes do lento suicídio

Pousarei meu último poema.


(Carlo G. Lanzarote)

1 Comment to "O Papel"

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